quarta-feira, 28 de abril de 2010

Escolhas


Qualquer imaginário, em tempos modernos, é composto por uma mistura inacreditável de fragmentos. No meu caso, casadoira que sou, o tema casamento, pelo que me lembro, bateu-me à porta pela primeira vez lá pelos 5, 6 anos, com “A história de Dona Baratinha”. Ouvi-a numa vitrola Philips amarela, que tocava aqueles discos compactos e coloridos.
Dona Baratinha tinha fita no cabelo (beleza) e dinheiro na caixinha (um dote). Sabia que com esses predicados estava pronta para casar, e que não seria muito difícil arranjar um noivo. Bastaria debruçar-se à janela, como essas namoradeiras de barro ou madeira feitas no vale do Jequitinhonha.
Havia, porém, um problema. Ela era tão mignon, mas tão mignon, que não podia escolher um pretendente qualquer. Precisava de alguém do seu tamanho. Por isso dispensou um gato, um cachorro e um elefante. Miado, latido e urro, sons estridentes demais para sua fragilidade de barata. “Sou muito sensível, e medo tudo me traz. Diga, primeiro, cãozinho [ou a qualquer um dos rapazes], como é que você faz?”, ela perguntava a quem quisesse colocar uma aliança em uma de suas patas invertebradas.
Finalmente encontrou alguém a não temer. Dom Ratão, sua baixa estatura e seus ruídos inofensivos encorajaram-na a ir em frente. Vestido de noiva, véu, grinalda... Dona Baratinha quis tudo a que tinha direito. Só não contava que, antes da cerimônia, Dom Ratão, roedor guloso, não resistiria ao cheiro de toucinho que vinha da cozinha. Aquele aroma o fez esquecer de tudo, até da noiva. Afoito, foi ao encontro de seu novo objeto de desejo e debruçou-se sobre a grande panela de feijão a ser servida após a cerimônia – que não aconteceu: traído pelo estômago, inebriado, Dom Ratão perdeu o equilíbrio e caiu dentro do panelão. Morreu afogado, ou queimado, ou ambos, e Dona Baratinha, a princípio inconformada, voltou à solteirice e à janela.
Moral da história para uma menina de 5 anos: casamento é algo muito complexo. Conclusão mais que óbvia: cuidado com o homem que você escolhe, noiva.

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